30.11.24

A NATUREZA DO AMOR


A natureza do amor

nunca me deixa só.

 

Ainda tece comigo

as letras e linhas

 

justas do teu nome. 

J. Aberto de Oliveira

19.10.24

A ROSA ANTERIOR






A rosa anterior às súbitas 

gotas de chuva.


A rosa e o pó

de seu perfume


inauguram 

o princípio do fulgor.


A rosa espera

apenas outro nome.

J. Alberto de Oliveira


4.10.24

SEM BIOGRAFIA


 

Não tenho biografia.

Eu sou um dia após dias e dias intemporais. Ou talvez a memória apenas de mim

próprio, A memória donde vim e para onde vou.

 

Uma vez alguém me perguntou:

- Por que é que tu és poeta?

Respondi:

- Não sei. Vai interrogar os meus ancestrais que já partiram para a eternidade.

E no outro dia escrevi:

“Quando saio de mim levo sempre uma trouxa de imagens e lembranças às costas. 

Assim vou trocando  um ror de coisas por alguns poemas".

J. Alberto de Oliveira


4.9.24

SÃO HORAS DO MAR


 

São horas do mar

atento

ao barco de ontem no horizonte.

 

É o mar que todo

se dobra sobre si mesmo

 

para me

deixar uma frase

no fim de cada pensamento.

J. Alberto de Oliveira


9.8.24

A VERDADE NO BRANCO


 

A verdade no branco

da página do universo

 

como posso vê-la?

 

A haver continuidade

depois de morrer


qual será ó Deus

 

a minha substância

definitivamente?

J. Alberto de Oliveira

 


18.7.24

NOS RECANTOS DO ÉDEN


 

Afinal, nos recantos do Éden havia bastante impostura. Nem tudo era delícias.

Havia limites à liberdade e uma cobra com muito veneno.

Afinal, Eva e Adão eram precários e originalmente inocentes.

Eram como os futuros humanos e não como deuses.

 J. Alberto de Oliveira


1.7.24

OS SELOS DO PASSADO



 

 

Os selos do passado

fazem da memória

 

um átrio onde o ar

 

avoluma o lume

em volta e dentro de nós.

 

Preciso de vidas amadas

 

que me traduzam

os selos do passado.

J, Alberto de Oliveira


10.6.24

ESCREVER NO SILÊNCIO


 

Às vezes minto nos versos para dizer a verdade que ninguém quer ouvir.

Há frases que escrevo ao contrário de mim mesmo.

Porquê?

Não sei.

Talvez porque tenho pensamentos, imagens e sentimentos que assim me esperam.

 

Escrevo por prazer em forma de palavras o que não sei dizer 

em silêncio.

Mas também escrevo no silêncio o que sobra das palavras

para ninguém saber nem adivinhar  os meus segredos.

J. Alberto de Oliveira

25.5.24

UM BEIJO NOUTRO BEIJO


 


A palavra singular

e ouvida

num tanque de água.

 

A memória sentida

numa folha

de silêncio musical.

 

A síntese de um beijo

cativo do amor

e sopro noutro beijo.

J. Alberto de Oliveira


11.5.24

QUANDO A ALMA É MUSICAL


 

Quando a alma é musical

 

e a matéria afeita ao verbo

se inspira nos dedos do ar

 

o som do violino rima

com os primores de obra-prima.

 

A beleza e o rigor estremecem

como se fossem a gramática

 

de nobilíssimos versos.

J. Alberto de Oliveira


4.5.24

NO COMEÇO


 

Nos dias de quase não existir

eu respirava o que dá vida.

 

Os fios da palavra e o pão

deixavam doçura e vigor.

 

Eu recebia o que dá amor.

O que vai acima do chão.

J. Alberto de Oliveira


17.4.24

SÔBOLOS RIOS QUE VÃO

 


Sôbolos rios que vão

por Babilónia, me achei,

onde sentado chorei

as lembranças de Sião

e quanto nela passei.

Ali o rio corrente

de meus olhos foi manado,

e, tudo bem comparado,

Sião ao tempo passado,

Babilónia ao mal presente.

[...]

Luís Vaz de Camões


9.4.24

PALAVRAS INÉDITAS


 

Seria uma ideia minha

ou foi uma evidência

aquele retrato distinto?

 

Um retrato aberto

ao incisivo silêncio

de palavras inéditas.

 

De tão leves e perfeitas

como dizê-las num verso? 

J. Alberto de Oliveira


16.3.24

OS SENTIMENTOS DA MÚSICA





Preclaras e distintas

são as estrelas de viena.

 

Em todos os violinos

ouve-se uma cadência

 

a alumiar os tempos.

 

Com frases musicais

se apura o dialecto do ar.

 

Beethoven e Mozart

transmitem de rua em rua

 

os sentimentos da música.

J. Alberto de Oliveira



4.3.24

A NOSSA ARTE


 

A arte do lusíadas, ou por assim dizer, a nossa arte, deve-se ao movimento dos ventos e das grandes águas que nos levaram “por mares nunca de antes navegados”, dando “novos mundos ao mundo”, no sentido épico de Camões.

J. Alberto de Oliveira


23.2.24

POESIA

 

                                                                                                          Desenho de Manuela Barbosa


J. Alberto de Oliveira nasceu em Santo Tirso, em 1945. Cursou Teologia. Franciscano, poeta e professor (aposentado).

Legente da intimidade musical. Escreve para, muito simplesmente, apurar a cadência do verso que falta ouvir. Muito cedo, aprendeu a dizer de si para si: “a conjura da sensibilidade e do pensamento, por vezes, faz de mim um clandestino que não sabe onde está”.

A deiscência acontece quando a alma e seus sentidos ficam disponíveis para a liberdade livre.

Emblematicamente – super foetida flumina.

 

Com o nome José Alberto de Oliveira publicou (poesia):

Alegria Irrecusável – 1974

Nos Vidros da Noite – 1983

A Ilha dos Amores – AJHLP, 1984 (obra colectiva)

 

Com o nome J. Alberto de Oliveira (poesia):

 

A Água do Nome – Edições Afrontamento, 1998

O Som Aproximativo – Edições Afrontamento, 2005

Palavras Escolhidas – Cadernos Nó Cego (1), 2005 (plaquete, fora de mercado)

No Linho Verbal – Cadernos Nó Cego (2), 2006 (plaquete, fora de mercado)

7 X 7 Versos – Cadernos Nó Cego (3), 2008 (plaquete, fora de mercado)

O Anjo Inefável – Cadernos Nó Cego (4), 2012 (plaquete, fora de mercado)

Entrepoemas – Edições Afrontamento, 2014

O Mês Maio da Mãe – C.Art – 2015

Das Varandas de Ver – Cadernos Nó Cego (5), 2017 (plaquete, fora de mercado).

Manu Scripta – Antologia de Poemas Manuscritos (obra colectiva), Ed. Glaciar, 2018

O Triunfo da Música (Poemas com desenhos de Luandino V. – plaquete, fora de mercado), Ed. Porta Treze, V. N. Cerveira, 2019

 

Em espera:

A Tela Tangível (poesia)

Gramática de Versos (poesia)

Num Pé d’Água (poesia)


Desenho de Manuela Barbosa


12.2.24

OS ANJOS DO POETA


 

OS ANJOS DO POETA

       para Alícia

 

Não são as cinzas do tempo.

 

São os anjos do poeta

que assediam os muros da casa.

 

E quando menos se espera

entram pela janela adentro

 

pedindo alguns versos para ficar.

J. Alberto de Oliveira


6.2.24

O CORAÇÃO DO SOL


 

O que falta nos meus olhos

para que eles possam ver

 

o coração abrasivo do sol?

J. Alberto de Oliveira


18.1.24

TRADUZIR O LUME


 

Num jogo de furtivas adivinhas

trocavam entre si respostas

 

e sonhos que eram perguntas.

 

A essência

vinha de pinhas acesas

 

que ardiam até ao fim

para traduzir o lume.

 J. Alberto de Oliveira