A
natureza do amor
nunca me deixa só.
Ainda
tece comigo
as
letras e linhas
justas do teu nome.
J. Aberto de Oliveira
A
natureza do amor
nunca me deixa só.
Ainda
tece comigo
as
letras e linhas
justas do teu nome.
J. Aberto de Oliveira
A rosa anterior às súbitas
gotas de chuva.
A rosa e o pó
de seu perfume
inauguram
o princípio do fulgor.
A rosa espera
apenas outro nome.
J. Alberto de Oliveira
Não tenho biografia.
Eu sou um dia após dias e dias
intemporais. Ou talvez a memória apenas de mim
próprio, A memória donde vim e
para onde vou.
Uma vez alguém me perguntou:
- Por que é que tu és poeta?
Respondi:
- Não sei. Vai interrogar os meus
ancestrais que já partiram para a eternidade.
E no outro dia escrevi:
“Quando saio de mim levo sempre uma trouxa de imagens e lembranças às costas.
Assim vou trocando um ror de coisas por alguns poemas".
J. Alberto de Oliveira
São horas do mar
atento
ao barco de ontem no horizonte.
É o mar que todo
se dobra sobre si mesmo
para me
deixar uma frase
no fim de cada pensamento.
J. Alberto de Oliveira
A verdade no branco
da página do universo
como posso vê-la?
A haver continuidade
depois de morrer
qual será ó Deus
a minha substância
definitivamente?
J. Alberto de Oliveira
Afinal, nos recantos do Éden havia bastante
impostura. Nem tudo era delícias.
Havia limites à liberdade e uma cobra com muito
veneno.
Afinal, Eva e Adão eram precários e originalmente
inocentes.
Eram como os futuros humanos e não como deuses.
Os selos do passado
fazem da memória
um átrio onde o ar
avoluma o lume
em volta e dentro de nós.
Preciso de vidas amadas
que me traduzam
os selos do passado.
J, Alberto de Oliveira
Às vezes minto nos versos para dizer a verdade que ninguém
quer ouvir.
Há frases que escrevo ao contrário de mim mesmo.
Porquê?
Não sei.
Talvez porque tenho pensamentos, imagens e sentimentos que
assim me esperam.
Escrevo por prazer em forma de palavras o que não sei dizer
em silêncio.
Mas também escrevo no silêncio o que sobra das palavras
para ninguém saber nem adivinhar os meus segredos.
J. Alberto de Oliveira
A palavra singular
e ouvida
num tanque de água.
A memória sentida
numa folha
de silêncio musical.
A síntese de um beijo
cativo do amor
e sopro noutro beijo.
J. Alberto de Oliveira
Quando
a alma é musical
e
a matéria afeita ao verbo
se
inspira nos dedos do ar
o
som do violino rima
com
os primores de obra-prima.
A
beleza e o rigor estremecem
como
se fossem a gramática
de
nobilíssimos versos.
J. Alberto de Oliveira
Nos
dias de quase não existir
eu
respirava o que dá vida.
Os
fios da palavra e o pão
deixavam
doçura e vigor.
Eu
recebia o que dá amor.
O
que vai acima do chão.
J. Alberto de Oliveira
Sôbolos rios que vão
por Babilónia, me achei,
onde sentado chorei
as lembranças de Sião
e quanto nela passei.
Ali o rio corrente
de meus olhos foi manado,
e, tudo bem comparado,
Sião ao tempo passado,
Babilónia ao mal presente.
[...]
Luís Vaz de Camões
Seria uma ideia minha
ou foi uma evidência
aquele retrato distinto?
Um retrato aberto
ao incisivo silêncio
de palavras inéditas.
De tão leves e perfeitas
como dizê-las num verso?
J. Alberto de Oliveira
Preclaras e distintas
são as estrelas de viena.
Em todos os violinos
ouve-se uma cadência
a alumiar os tempos.
Com frases musicais
se apura o dialecto do ar.
Beethoven e Mozart
transmitem de rua em rua
os sentimentos da música.
J. Alberto de Oliveira
A arte do lusíadas, ou por assim dizer, a
nossa arte, deve-se ao movimento dos ventos e das grandes águas que nos levaram “por
mares nunca de antes navegados”, dando “novos mundos ao mundo”, no sentido épico de Camões.
J. Alberto de Oliveira
Desenho de Manuela Barbosa
J. Alberto de Oliveira nasceu em
Santo Tirso, em 1945. Cursou Teologia. Franciscano, poeta e professor
(aposentado).
Legente da intimidade musical.
Escreve para, muito simplesmente, apurar a cadência do verso que falta ouvir.
Muito cedo, aprendeu a dizer de si para si: “a conjura da sensibilidade e do
pensamento, por vezes, faz de mim um clandestino que não sabe onde está”.
A deiscência acontece quando a
alma e seus sentidos ficam disponíveis para a liberdade livre.
Emblematicamente – super
foetida flumina.
Com o nome José Alberto de Oliveira publicou (poesia):
Alegria Irrecusável –
1974
Nos Vidros da Noite –
1983
A Ilha dos Amores –
AJHLP, 1984 (obra colectiva)
Com o nome J. Alberto de Oliveira (poesia):
A Água do Nome – Edições
Afrontamento, 1998
O Som Aproximativo –
Edições Afrontamento, 2005
Palavras Escolhidas –
Cadernos Nó Cego (1), 2005 (plaquete, fora de mercado)
No Linho Verbal –
Cadernos Nó Cego (2), 2006 (plaquete, fora de mercado)
7 X 7 Versos – Cadernos
Nó Cego (3), 2008 (plaquete, fora de mercado)
O Anjo Inefável –
Cadernos Nó Cego (4), 2012 (plaquete, fora de mercado)
Entrepoemas – Edições
Afrontamento, 2014
O Mês Maio da Mãe – C.Art
– 2015
Das Varandas de Ver – Cadernos
Nó Cego (5), 2017 (plaquete, fora de mercado).
Manu Scripta – Antologia
de Poemas Manuscritos (obra colectiva), Ed. Glaciar, 2018
O Triunfo da Música – (Poemas
com desenhos de Luandino V. – plaquete, fora de mercado), Ed. Porta Treze, V. N.
Cerveira, 2019
Em espera:
A Tela Tangível (poesia)
Gramática de Versos
(poesia)
Num Pé d’Água (poesia)
Desenho de Manuela Barbosa
OS ANJOS DO POETA
para Alícia
Não são as cinzas do tempo.
São os anjos do poeta
que assediam os muros da casa.
E quando menos se espera
entram pela janela adentro
pedindo alguns versos para ficar.
J. Alberto de Oliveira
O que falta nos meus olhos
para que eles possam ver
o coração abrasivo do sol?
J. Alberto de Oliveira
Num
jogo de furtivas adivinhas
trocavam
entre si respostas
e sonhos que eram perguntas.
A
essência
vinha
de pinhas acesas
que ardiam até ao fim
para traduzir o lume.