11.4.22

O REDIVIVO EM TRÊS DEGRAUS


1 - ENREDO

 

Madalena foi ao sepulcro muito cedo. Ainda era escura a madrugada.

Madalena olhou para dentro do rochedo e viu que estava limpo e vazio. Ainda bem, porque assim ela passa de uma cisma a outra.

Madalena esquece num relâmpago a palidez do corpo deixado no abismo da morte e principia a intuir um corpo redivivo, iluminante.

Em alvoroço ela correu para o mundo. Foi contar tudo.

Madalena correu ao ritmo da memória tocada por palavras novas.

Pelo caminho, Madalena aprendeu a conjugar o verbo ressuscitar com ressonâncias vivas, rutilantes.

 

 

2 - QUASI-POEMA

 

A ressuscitação foi um sublime flash divino.

Um instante de vigor na presença de anjos.

 

E depois, só depois, foi dito aos humanos: “ressuscitou!”

 

O redivivo mostrou-se e falou a quem procurava o seu corpo,

seu corpo de súbito renascido para o alvoroço do encontro.

 

O redivivo falou primeiro à mulher que saiu de casa

pelo silêncio da madrugada ainda escura.

 

Superando a distância, as encruzilhadas e as horas tardias,

a mulher antecipou-se aos ruídos do mundo.

 

Venceu a negrura, a morte e o vazio.

 

 

3 - POEMA

 

Para dentro da pedra

escorre em ferida

o silêncio da pergunta

 

onde o puseram

o corpo que tanto procuro?

 

Para dentro da pedra

se debruça

o pensamento da mulher

 

apurando os sentidos do amor

com perfumes de lume novo.

 J. Alberto de Oliveira