19.12.07

17.12.07

OH NOITE SUBLIME





Oh noite sublime
de tão branda

faz de mim uma pausa
ardentemente viva

entre o beijo e a alma.


J. Alberto de Oliveira

30.11.07

NESTE SÍTIO DE SILÊNCIO



Agora
que te surpreendo

e amo
neste sítio de silêncio


um ramo de sol
aviva a nudez da água.

O pão torna-se maior.


E a toalha da mesa
fica muito branca.

Fica toda iluminada.

J. Alberto de Oliveira

15.11.07

UNICUM NECESSARIUM




Quando nasci - e foi o que falaram - eu era o meninopoeta 
que não dizia nem escrevia os versos que em mim havia.

E quando vier a hora incerta
do obscuro nó de tudo

seja eu ainda poetamenino.

Sejam de asa ou de névoa 
os últimos versos da minha língua.

J. Alberto de Oliveira

3.11.07

SOPRO A SOPRO





Rendo-me à evidência
das letras e palavras

em que sopro 
a sopro me escrevo.

À margem do mundo
aida respiro

quase absorto
altivo e profundo.

J. Alberto de Oliveira

15.9.07

O SÉTIMO SELO




Amada como um sonho
a rosa


é o sétimo selo.

A matéria luminosa
da primeira 


lembrança de Deus.

J. Alberto de Oliveira

NO SILÊNCIO DO VIDRO




Entre duas sílabas
o amor

e o indizível estremecem.

Há um fulgor
tangivelmente sentido

no silêncio do vidro.


J. Alberto de Oliveira

27.7.07

A OBRA QUE SE ESBOÇA




A lua no mar
e a noite que se demora

furtivamente são 

o desenho e a casa.

A obra que se esboça
na palma da tua mão.


J. Alberto de Oliveira

19.7.07

A REFLEXA LUZ


Ao meu Pai que me ensinou a olhar, a ver e a ser para lá da luz do horizonte

Aqui entre a poeira
do mundo

uma névoa de vento
cintila
e te perpetua em paz.

Aqui a reflexa luz
de que vivias
fez-se névoa de asas.


J. Alberto de Oliveira

13.7.07

O ORVALHO DO NOME

Fotografia: J. A. de Oliveira



Quando chegar a casa
no sítio onde moras

quero ainda ver o linho
todo em flor.

Quero ver no linho
o orvalho do nome

que perdi à tua porta.

J. Alberto de Oliveira

9.7.07

O LUXO DE SER

Fotografia: J. A. de Oliveira



Contenta-me ser banido 
pelos trôpegos da palavra 

pelos inestéticos da vida
pelos duros de coração

pelos fiéis da ganância
pelos imbecis da alma.

J. Alberto de Oliveira

5.7.07

PERDIDAMENTE FLORBELA



Do primeiro ao último verso
a tua voz
alude à sede suprema.

Responde às promessas
de que tão perdidamente viveste.

J. Alberto de Oliveira

29.6.07

PIER PAOLO PASOLINI





Per essere poeti, bisogna avere molto tempo:
ore e ore di solitudine sono il sono modo
perchè si forma qualcosa, che è forza, abbandono,
vizio, libertà, per dare stile al caos.
Io tempo ormai ne ho poco...

Pier Paolo Pasolini

AO VIR DA MADRUGADA

Fotografia: J. A. de Oliveira



Ao vir da madrugada
o pensamento do amigo

ilumina-se de orvalho.

Luzem versos  
por onde passa a vinda.

Ao vir da madrugada

o pensamento do amigo
torna-se muito leve

junto à porta da amada.

J. Alberto de Oliveira

22.6.07

SETE GOTAS

Fotografia: J. A. de Oliveira



Ao cego e silencioso 
infinito do sono

abre-se o luzir
das primeiras gotas

dadas à noite
propícia ao relento.

É o luzir de sete gotas
de sangue e perfume

de puro enamoramento.

J. Alberto de Oliveira





10.5.07

SPREZZATURA



Joy, largueza, proeza - são cânones da cortesia provençal que informaram toda a juventude de Francisco de Assis. Os seus companheiros recordavam-no "pródigo e cauto mercador, mas magnificentíssimo, altivo e generoso, ligeiro e não pouco audaz, superior em grandeza de alma, rico em liberalidade".
No sonho da conversão viu unicamente símbolos cavaleirescos.
Convertido, reclamando-lhe o pai os seus haveres e citado perante o bispo, efectuou uma sprezzatura deslumbrante, despindo-se até ficar nu em pleno episcopado e atirando as roupas para o chão. (O bispo agiu admiravelmente a condizer, cobrindo-o com o seu próprio manto).

Cristina Campo - Os imperdoáveis

15.3.07

O CÂNTICO DOS CÂNTICOS

Fotofrafia: J. A. de Oliveira






O Cântico dos Cânticos é um belíssimo poema a iluminar a palavra Amor. É uma vitória dos que amam, tendo como alicerce as forças mais vivas da natureza.
Será possível um grande amor sem a terra fecunda, sem as águas correntes, o sol, as flores, o vento?
Os animais e as plantas rejubilam com o amor do homem e da mulher.
Dir-se-ia que o o Cântico Maior, também assim dito, subtilmente revela que o amor nos humanos move-se do lado do amor de Deus.
É o cântico de núpcias da Criação!
É uma outra forma de exprimir o indizível, o espaço onde a mulher surge primeiro e se movimenta, como quem procura uma alegria perfeita.
Melhor que o homem a mulher sabe do essencial.

J. Alberto de Oliveira

21.2.07

SE VIVO AMOR NOS MOVE




Se vivo amor nos move
que delicado verso

ou palavra amada
em nós começa

em nós se demora

e depois
com sentido pudor

no mar adormece?

J. Alberto de Oliveira

10.2.07

TE DEUM



                                         para Cerqueira Gonçalves

Louvai e bendizei o Amor no Verbo!
Louvai o Eterno
vós, legentes do Poema!

Vós, que ledes, em seus versos

outros versos, outras palavras,
outras sílabas e letras
subtis, amantes do mistério!

J. Alberto de Oliveira

31.1.07

NO DIALECTO DA ÚMBRIA

Fotografia: J. A. de Oliveira



Perto do fim da sua vida, doente, virtualmente cego, Francisco de Assis escreveu, em louvor a Deus, o "Cantico delle Creature". Redigido numa cabana situada nas proximidades do convento de S. Damião, onde viviam as primeiras clarissas, este texto veio a lume no dialecto da Úmbria, a língua vulgar, do povo, por contraponto ao latim então usado por eruditos e teólogos. Os versos, terminados em 1226, foram publicados no Codex 338 de Assis, um documento no qual, após os versos foi deixado um espaço em branco, um vazio que nunca chegou a receber as notas destinadas a musicar o poema. As palavras de Francisco de Assis, que abraçou o voto de pobreza absoluta como regra de vida, constituem uma espécie de texto panteísta, sendo nele celebrados não só os elementos naturais - o sol, a lua, as estrelas, o vento, a água, o fogo, a terra - mas também "nossa irmã a morte corporal" ("sora nostra morte corporale"), à qual nenhum homem pode escapar. Febril, atormentado por ratos, o Santo, que sempre procurou a negação total de si próprio, quis, mesmo assim, deixar em língua pobre, ainda sem nome, a sua entrega ao silêncio.

Óscar Faria - "Mil Folhas" - 26/01/2007


23.1.07

FIAMA HASSE PAIS BRANDÃO

Fotografia: J. A. de Oliveira


O pórtico da poesia de Fiama:

Água significa ave.

A fala de Fiama Hasse Pais Brandão é um todo coroado pelos seus últimos versos escritos junto ao mar do Algarve:

MEIO DIA / MEU DIA

Na pele sinto o percurso das ondas,
mais amplo e intenso do que o périplo do sol.
E, no entanto, este vai-se gerando a si mesmo,
a cada momento, até à placidez
do meio-dia. São feitos de horas, contínuas, eternas,
aqui, na ria, os dias. Hoje,
meu dia, o coração e o dia rejubilam.

10.1.07

MATÉRIA LUMINOSA

Fotografia: J. A. de Oliveira




Há um movimento cego
da mão
que principia no fogo.

Serve-se da matéria
luminosa da boca

para transmitir ao vidro
a perfeição 
da sede que nos respira.

J. Alberto de Oliveira