29.12.08
22.12.08
BILHETE DE NATAL
15.12.08
O VAGABUNDO
A personagem de Charlot, que tantos críticos e biógrafos endeusaram ao serviço das conveniências de cada um, aparece-nos reduzida às justas proporções, com feições de anjo e traços de demónio, meio Quixote, meio Sancho Pança, com coração, cabeça e estômago – o que o torna a figura cem por cento humana.
Esse retrato “tirado pelo natural” desconcerta e decepciona os hagiógrafos de São Charlot, pois desfaz todas as teorias que à roda do bonifrate chaplinesco erigiram para edificação da humanidade.
Chaplin descreve com prodigiosa lucidez o carácter da sua genial criação, que lhe surgiu a bem dizer inteira e completa naquela tarde de Edendale, quando pôs “umas calças muito largas, uns sapatos muito grandes, bengala e chapéu de coco”, e adoptou um bigodinho que o fizesse parecer menos jovem sem contudo lhe esconder a expressão. Indumentária que ele quis “contraditória”, de harmonia com a própria personagem: “as calças largas e o casaco apertado, o chapéu muito pequeno e as botas enormes”. E logo descreveu a Mack Sennett o tipo multifacético que imaginara: “um vagabundo e ao mesmo tempo um cavalheiro, um poeta, um sonhador, um solitário, sempre ansioso por idílios e aventuras”, que “gostaria que o tomassem por um sábio, um músico, um duque ou um jogador de pólo”, mas que “não desdenha apanhar uma beata do chão ou furtar o chupa-chupa a um bebé”, nem “perde a ocasião de dar um pontapé no traseiro de uma senha... mas só quando está fulo!”
Naquele cenário de átrio de hotel em que lhe ensaia os primeiros passos, Chaplin tem a impressão de que Charlot, empertigado e afectado, é “um impostor que se fazia passar por cliente, quando na realidade era um vagabundo que apenas procurava abrigo”.
António Lopes Ribeiro
in “Charles Chaplin – Autobiografia”
9.12.08
QUE HORAS SÃO?
Deve-se estar sempre embriagado. Nada mais importa.
Para que o horrível fardo do tempo não vos pese sobre os ombros e vos faça pender para a terra, deveis embriagar-vos sem cessar.
Mas de quê?
De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa escolha.
Mas embriagai-vos!
E se um dia nos degraus de um palácio, na erva verde de uma valeta, na solidão baça do vosso quarto, acordardes, já sóbrios, perguntai ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai:
– Que horas são?
– São horas de vos embriagardes!
Para que não sejais os escravos martirizados do tempo, embriagai-vos sem cessar. De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa escolha.
Charles Baudelaire(Tradução: Jorge Sousa Braga)
8.12.08
A NEVE
CITAÇÕES DO OLHAR
S. FRANCISCO DE ASSIS
S. Francisco de Assis falava outrora
Às aves e às ervinhas, triste e só…
Se tudo quanto vive, sofre e chora,
É a mesma alma eterna, o mesmo pó!
Por isso ele sentia pena e dó
Por tudo quanto doira a luz da aurora,
E não bebeu no poço de Jacob
Aquela água de vida redentora.
Irmão morte, irmão corpo, irmãs ervinhas!
Ó pedras! Ermas fontes pobrezinhas!
Lobos, uivando à lua, em erma serra!
Quanto vos amo em Deus! E sinto bem
Que esta terra que eu beijo é nossa mãe
E que a sombra de Deus anda na Terra!
Teixeira de Pascoaes
Fotografia: J. Alberto de Oliveira
15.10.08
7.10.08
O SILÊNCIO VIBRANTE
(...) Falo de uma viagem onde é possível perder o próprio nome, e morrer disso.
E então viver.
Não dormindo, como as nossas bestas respeitáveis.
Viver - digo eu.
E que o nosso afastamento, o silêncio vibrante, a grande morte pensada e amada nas profundidades - fossem bastante para vergar as bestas todas, empurrá-las pelo seu próprio sono abaixo, afundá-las até ao inferno.
Herberto Helder - Apresentação do Rosto
NA CARREIRA DA ESTRELA
Entrando eu num eléctrico (recordo-me bem, era da carreira da Estrela), deparo com Fernando Pessoa que me pergunta de chofre:
– Já notou uma coisa, ó Pascoaes? Há escritores de quem toda a gente fala e ninguém lê, e outros de quem ninguém fala e toda a gente lê. E destas duas espécies, qual, em seu entender, tem mais valor?
Respondi que aqueles de quem toda a gente fala e ninguém lê, e Fernando Pessoa rematou:
– É também a minha opinião.
(De uma entrevista de Teixeira de Pascoaes)
5.10.08
A PRIMEIRA VIAGEM
3.10.08
ESTRELA VIVA NO CÉU
19.9.08
UMA VARA DE FOGO
18.9.08
FIGURAS DE BRUMA
TRÊS VEZES AMOR
30.7.08
SALMO
23.7.08
A CASA
25.6.08
O SEGREDO MAIOR
No lugar onde ouvi
o segredo maior
havia um tanque
de água e limos
e delírios da alma.
Florido estremecia
na água o linho.
Estremecia o silêncio
rente à flor do segredo.
J. Alberto de Oliveira
12.6.08
O MENSAGEIRO
10.6.08
DUAS PALAVRAS
- Onde vais buscar o linho verbal que há nos teus versos?
- À substância unitiva e configurante dessas mesmas duas palavras.
J. Alberto de Oliveira
4.6.08
A PRONÚNCIA MUSICAL DE J. S. BACH
6.5.08
O ROSTO QUE SONHA
para José Rodrigues
Não se sabe donde
vêm a mão
o silêncio e a luz.
Com elementos primordiais
e legendas vivas
do Santo de Assis
descem e mostram o rosto
que sonha demasias.
São demasias de ser
e ternura.
Debaixo da mão
do silêncio e da luz
resplende e sonha
o primeiro de muitos rostos.
J. Alberto de Oliveira
5.5.08
DO CANTO MAIOR
[...] perguntam à Sulamita o que o seu amado tem de particular, sobretudo que tem ele que elas também não tenham nos seus
com as colunas e as minhas longas pernas onde gosta de se enrolar como heras e vinha virgem, embrenhou-se, parou ofegante,
deslizava pela minha pele mais escura que a noite, corria pelas minhas formas mais firmes que o solo dos seus combates e, finalmente, depôs em mim o segredo do seu veneno; quando acordei, estava só e tive medo que tivesse morrido ou, se morto,
eu não conseguisse encontrá-lo como meu, ou eu?
Maria Gabriela Llansol - ONDE VAIS DRAMA-POESIA?
10.4.08
OS SONS DA MELANCOLIA
4.4.08
A ALMA A PRUMO
21.3.08
UM NÚMERO VAGABUNDO
17.3.08
MARIA GABRIELA LLANSOL
Maria Gabriela Llansol, que "temia a impostura da língua", tornou-se vulnerável às "sombras do luar libidinal".
Doou-nos o fulgor da textualidade.
Convida-te a seres legente do texto, do "desejo insustentável de eternidade".
M. G. Llansol ensina que "escrever é amplificar pouco a pouco" e que o acto de ler é "uma alma crescendo".
J. Alberto de Oliveira
6.3.08
O VESPERTINO COMEÇO
22.2.08
PARA ALÉM DA MARGEM
Os poetas, os santos, os artistas - no seu obstinado desassossego e desejo de perfeição - atingem a consciência, a lucidez sensível e altiva do que são e onde estão:
para além da margem.
J. Alberto de Oliveira
19.2.08
EM SETEMBRO
corre ao vento pelo mundo
alude o amor e o sangue
de seu maternal aprumo.
Resplendece ao vento
a mulher que em setembro
leva rosas da infância
e júbilo em seus cabelos.
J. Alberto de Oliveira
5.2.08
UM ESTREMECER QUIETO
30.1.08
UM ABISMO DE VIDA
Talvez as águas em vertigem
me assinalem o rosto
e os pensamentos
a alma e os sentidos
do corpo todo.
Não olhes nem lhes toques.
É um abismo de vida
o perigo de morte.
J. Alberto de Oliveira
28.1.08
QUASE DE AMOR
Trata-se de um nome
escrito ao frio
muito branco da lua.
Trata-se do esplendor
de geadas e linho puro
num lenço antigo.
Num lenço que dizes
ser quase de amor.
J. Alberto de Oliveira
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